sábado, 10 de maio de 2014

O encontro com a deusa

O despertar de uma consciência é algo muito profundo. Despertar é a sensação que sinto como se estivesse adormecida por milhões de anos. É como se estivesse hibernando dentro de mim sentimentos sagrados e necessários ao meu viver e de repente, o mundo se colore com novas cores pra mim.
Numa noite de paz, reuniram-se mulheres de bem, no que eu chamo interiormente de um jeito carinhoso de "roda cósmica". Quis o Universo, os astros, a Força Divina e a ancestralidade que eu estivesse entre essas privilegiadas mulheres. Era pra ser o encerramento de um curso, um noite de pizza informal, mas pra mim, foi meu despertar.
Lembro dos olhos de cada uma delas. Lembro das minhas reações de espanto seguidas por sensação de familiaridade. Tudo o que elas me diziam parecia que, de alguma forma, eu já sabia. Como se eu fosse a pequena Dinah entre suas mães na tenda vermelha antes de ser mulher, mas naquele dia, me sentia Dinah em seu casamento com a terra. Ávida por vivenciar os mergulhos que só a oralidade pode nos conceder. E naquele dia, me casei com a terra. A terra dentro de mim. O ciclo sagrado havia me permitido que eu fizesse parte dele e despertasse para a nova consciência que ele me oferecia.
Do primeiro despertar surgiram outros. E passei a entender que havia dentro de mim uma enorme força. Uma chama para aquecer, uma água para matar a sede. Um vento que me guiava e uma terra a qual eu pertencia. Havia em mim uma deusa. Minha deusa interior. Meu orgulho de ser quem posso ser hoje, mulher.
Mas não um orgulho machista e tolo, não esse orgulho sexista que vemos cotidianamente. Um orgulho que permitia que eu me reverenciasse por ter nascido nessa condição. Condição essa que me permite trazer a paz na palavra e a vida no ventre. As mãos que curam e o olhar que tranquiliza. O fogo que ama e a água que nutre.
O encontro com a minha deusa interior fez com que eu despertasse para olhar todas as mulheres a minha volta. Era como se pudesse ver nelas irmãs. Filhas do mesmo ventre. Claro que mesmo entre irmãs, nem todas se amam e tem aquelas que não gostaríamos de ter conhecido, não vou ser desonesta comigo mesma. Mas entendia que eram mulheres como eu e uma ternura branda aplacava meu coração.
Encontrar a deusa dentro de si implica em ver o mundo de uma maneira completamente diferente. Nunca mais poderei ver e sentir o que via e sentia. É um despertar profundo demais para continuar sendo a mesma. Ao mesmo tempo percebia que havia muito de tudo isso em mulheres que viviam comigo. A ancestralidade é a natureza do amor dos que foram nos chamando para amar agora.
Passei a reverenciar a minha natureza, a compreender meus ciclos, a aceitar meu corpo e também a respeitar o tempo de cada uma, inclusive meu próprio tempo.
Hoje, olho para a Lua e sinto sua energia me guiando. Acredito que a Força Divina nos guia e vive em nós, como uma chama acesa e que nos ilumina, para que possamos iluminar o mundo a nossa volta.
O encontro com a minha deusa interior não faz de mim uma feminista descabida, achando que sou melhor que os homens porque sou mulher. Mas faz de mim alguém que entende a Suprema Sabedoria da Criação que nos fez mulheres e homens, e que se for de nossa vontade, num ato de amor, podemos dar uma nova vida.
Hoje, bebo água limpa na concha. Respiro fundo durante a lua nova e agradeço a natureza que se manifesta em mim. Agradeço todos os dias por ter bebido das palavras, dos gestos e dos ensinamentos daquelas mulheres queridas que trago como flores no jardim do coração.Agradeço à minha mãe que me recebeu com tanto amor em seu ventre e me deu a vida maravilhosa que tenho hoje. Devo minha respiração tranquila nesse momento à ela. Agradeço todas as mulheres que me acompanham, que podem ouvir dentro de si seus chamados interiores.
Ouço minha ancestralidade me chamando. Os tambores tocam no coração.
Que nossas vidas sejam abençoadas e que todas, um dia, possamos cantar e uníssono com as deusas que habitam dentro de nós.
Selah.