Mas é verdade que as obrigações estavam mais monótonas ainda sem o celular frenético piscando, com uma mensagem dela que o fizesse sorrir. Superaria, pensou.
Mas a imagem mental não afeta tanto quanto a aproximação de fato. Imaginá-la, pensar nela, doía um pouco, mas como seria quando cruzasse com ela? Possibilidade remota, mas existia.
Foi pensando nisso no caminho, atrasou-se e quando lá chegou, não a viu. Suspirou um pouco decepcionado, mas talvez fosse melhor assim.
Mas os olhos dele foram puxados na direção de um ponto, por um magnetismo incontrolável. Era ela. Caminhava a passos lentos, respirando profundamente o ar da manhã até que foi atraída igualmente pelo mesmo magnetismo.
Fez-se um sorriso morno nos lábios dela e ele sentiu o coração acelerar. Batidas descompassadas fora do ritmo dos passos dela. Ela caminhava lentamente, olhando pro céu, pro chão até sorrir.
- Oi...
- Oi, Lívia.
Então chamaram o nome dela, ela balbuciou um já volto e foi se afastando. E a medida que ela caminhava pra longe, o coração dele se comprimia, em batidas dolorosas e uma sensação de perda que não sentira até então.
A saliva engrossou na boca, o nó parou na garganta e os olhos anunciavam a chegada do arrependimento. Lívia, nossa, ela era tão linda. Agora parecia mais. O ar da manhã fazia bem a ela. O perfume de morango silvestre com frutas cítricas, o olhar profundo que ela tinha. Será que ainda gostava dele?
Mas ela parecia distante, uma distância imensa, como uma madona no altar e um desvalido arrependido de toda sorte que fizera mau uso.
Distanciou-se o quanto pode, não queria que o vissem abalado, especialmente ela. Uma lágrima lançou dos olhos rumo as mãos dele. Enxugou rápido. Não pensou que fosse doer tanto vê-la.
- Tá tudo bem?
Teve suas meditações amargas cortadas pela voz aveludada dela. Ela o conhecia. Parece mesmo que sabia que ele estava chorando por dentro e agora, por fora.
- Dormi mal, meus olhos estão ardendo. Acho que é sono.
- Hum...
Ela contemplava a natureza com singular serenidade. Parecia emanar dela um imenso amor por todas as coisas do mundo. Sentia que as lágrimas subiam pelos olhos, aflitas em se lançarem em direção a ela, como que um pedido desesperado por uma faísca desse amor. Ela estava tão perto, havia tanto amor nos olhos dela quando olhava pra ele. Mas o mundo, ah, o mundo parecia mais interessante que a moça singela que Lívia era.
Sentia-se o mais desafortunado e o mais imbecil dos homens.
Ela olhou pra ele e sorriu, sem mostrar os dentes. Parecia constrangida.
Ele, sem poder conter mais a emoção que ela fazia aflorar, disse:
- Isso dói.
- Isso o que?
- Essa distância de você.
Ela calou. Olhou para os céus, como quem busca respostas ou alguma força.
- Eu sei que dói.
- Não precisa ser assim, Lívia.
- Você quis assim, João...
- Eu sei, eu fiz tudo errado. Mas não achei que fosse doer tanto ver você.
- É só seu ego ferido.- disse enquanto buscava se esquivar mas ele segurou-a pelo braço.
- Espera, Lívia. Vamos conversar.
- Conversar o que João. - disse ela com indizível ternura e mágoa no olhar.
- Desculpa? Me perdoa, vai, por favor?
- Depois a gente conversa, João. Aqui não é hora, nem lugar.
Ela se afastava com passos firmes, o coração na mão e algumas lágrimas nos olhos que não caíam.
Ele chorava já se esconder. Viu o tempo, a oportunidade de amar e ser amado, os sorrisos dela, a risada gostosa que ela tinha, o amor que ela lhe devotava, a paz que sentia quando estavam juntos, tudo se esvaindo por entre as próprias lágrimas e se desfazendo no chão, para o sol secar. Havia jogado tudo fora. Tinha perdido a mulher da sua vida por idiotice, indiferença e falta de noção.
Doeu e a medida que ela se afastava, doía mais.
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