domingo, 12 de maio de 2013

Heresia

Surgiu a segunda-feira fria, eu tinha rezado um dia antes pra minha Santa Inês me proteger desse sentimento. Saí de casa respirando aquele ar frio. Tudo daria certo. Das colinas vastíssimas ao sol que surgia em tons alaranjados. Livra-me, Santa Inês, eu tenho medo desse coração que bate aqui. Então, entre as verdes folhagens eu o avistei. E meu coração se cortou em navalhas do frio e da incompreensão. Por que, Santa Inês? Por que, tu?
Fugi da minha heresia, passei rapidamente por ti, não me viste, nem me notaste e eu sumi entre os pomares do inverno.
Nunca pude olhar muito tempo nos olhos teus e não consigo conversar contigo fitando-te profundamente nos olhos. Eu tenho medo de gostar demais de olhar pra eles, de me perder na floresta verde que eles me sugerem e não querer nunca mais sai de lá.
Eu fugi de ti, tantas vezes eu fugi de ti.  Torturava-me ao furtar-me da tua companhia, porque tinha medo que olhos meus me denunciassem, de que tu percebeste, nos mínimos detalhes, no silêncio que as vezes se fazia entre nós, o bater descompassado do meu coração amedrontado.
É uma heresia, minha Santa Inês! Segura meu coração Contigo, não posso desejá-lo! Valei-me, Nosso Senhor! Eu não posso, Deus! Não é certo, eu pensava. E quando juntava as mãos em oração, via-te, sorrindo, aspirando em largos haustos o frio desses dias, no sorriso convidativo de esperança de dias porvindouros.
Eu procurava no teu olhar uma condenação, uma denuncia tua, um não qualquer. Mas nada. Então eu balançava a cabeça afastando estes pensamentos todos, valei-me Santa Inês! Que minha alma seja forte como eu tento ser!
Da última vez, me abraçaste de um jeito e eu tentei fugir dos teus braços. Porque eu queria ficar ali, queria voltar e pedir "abraça-me de novo", tantas vezes quanto necessárias. E afasta todos esses medos daqui. Mas eu não podia, eu não posso. E fugi dos teus braços como o diabo foge da cruz, porque lá no fundo, com essa fuga toda, ele só quer a redenção do amor do Cristo.
E todas essas suposições que me assolam ao dormir, quando rezo tanto, acordo pensando em ti. És a primeira face que pinta na minha mente quando mal abri os olhos. E te vi sorrindo mais uma vez pra mim.
Minha Santa Inês, apenas aguardo o Tribunal do Santo Ofício, trazendo minha condenação.
"Herege, herege!" eles me dirão. E eu fugiria mais uma vez se conseguisse, mas já não posso, reconheço meus pecados. Abro meu coração ao Nosso Senhor, que Ele me perdoe cem vezes por esses pensamentos. Herege, sim. Esta sou eu. Herege por ti, condenada pela Inquisição das circunstâncias, queimando na fogueira desse amor.


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