domingo, 24 de fevereiro de 2013

Vitória Régia

Lembrou-se do reflexo da Lua visto do pier. De como ela parecia valsar nas águas tranquilas, bem lá no fundo, quase como um convite ao desconhecido. Lembrou-se da história de Naiá, que sua tia lhe contava sempre, quando ainda era uma menina. Dizia fazendo vincos pelo rosto marcado pela idade e pela bondade de sua alma:
- Sabe, fia, Naiá era uma índia muito linda, a mai bonita de todas. E quando ia pra beira da lagoa, era pra namorar a Lua. Achava que a Lua era um guerreiro que morava no céu, fia...
E lembrou cada detalhe da lenda da Vitória Régia, depois ficou pensando que a vida devia ser como a vida de Naiá. É claro que a índia teve um final meio trágico, mas ao renascer como uma flor, pensou que isso simbolizava, de uma certa forma, um desabrochamento para vida de verdade.
Tínhamos que mergulhar nas águas do desconhecido em busca de algo para nos encontrarmos.
E Indira tinha que mergulhar naquelas águas. Tinha que ir de encontro ao reflexo da Lua. Não porque acreditasse que era uma ilusão, mas queria ser uma estrela da água, queria deixar seus cabelos afundarem devagar e ceder as mil e uma gotas. Queria molhar a pele clara e tiritar de frio, sentir a barriga encolher e as costelas ficarem mais evidentes por isso.
Não queria passar a vida olhando o reflexo da Lua na água, pensando como seria dissipar aquela imagem, como seria mergulhar de encontro a ela. Não queria passar a vida evitando tudo porque o medo poderia retê-la na superfície.
Não dá, Indira, não se pode viver a vida com tanto medo de tudo.
Indira tinha que ser Naiá. Levantou-se e pegou as chaves do carro. Dirigiu meia hora e bateu ali. Dois minutos e ele abriu.
- Di? O que você tá fazendo aqui uma hora dessa?
- Oi...Desculpa chegar sem avisar, eu não quero ser invasiva nem melosa, mas eu tava pensando em você e decidi passar aqui, queria te fazer um convite.
- Convite?
- É..
- Diz!
Ele sorriu. E todos aqueles dentes bem alinhados e perfeitamente brancos faziam lembrar o brilho da Lua. Aquele brilho que ela se encantou e a fez pensar que Indira tinha que ser Naiá e de repente ele era a Lua. Iluminou-se por dentro com o sorriso dele. Abriu um sorriso bem dela e disse:
-Vamos nadar lá no lago?
- Agora?
- É, eu queria tanto te mostrar uma coisa.
Ele sorriu, quase como que se entendesse o que ela queria dizer.
Eles foram juntos, quase sem falar, e a Lua, em sua majestade, iluminava a estrada. Em pouco tempo chegaram. Ele tirou a camiseta, ela puxou-o pelas mãos enquanto caminhavam lentamente em direção a Lua no lago.A noite estava muito quente. Ficaram quietos até que as marolas que seus corpos fizeram em contato com a água desaparecessem.
- Olha...
- Nossa, parece que ela tá aqui.
- Mergulha comigo?
E de mãos dadas eles afundaram nas águas escuras em busca da Lua. O reflexo se desfez com a agitação dos corpos que eram banhados pelos raios de prata da confidente dos poetas e inspiração dos apaixonados. Quando subiram, aproximaram-se. Ele a beijou e minutos depois ela sorriu:
- Foi assim que Naiá se apaixonou pela Lua...


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